Continua a repercutir a 14a Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo. A editora  Kate Wilson acaba de postar lá no seu blog,  em inglês,  mais um aparte na discussão que envolveu Alberto Manguel, Beatriz Sarlo e este cronista, naquela fervente sessão em que se discutiu a formação do leitor na sociedade atual.
Tudo começou quando Kate, (a escocesa que já trabalhou na MacMillan  e hoje tem sua própria editora) estava projetando imagens sobre como os leitores  adolescentes poderiam interagir com a história da Cinderela. Manguel- argentino e historiador da leitura  que hoje vive no Canadá, pulou na garganta dela dizendo cruamente que tinha pensado que ia discutir a "formação" não a  "deformação" do leitor. Ela retrucou, ele de novo bateu forte, Beatriz Sarlo entrou de sola acusando a editora de "kitsch", etc.
Acabei interferindo porque a discussão se polarizou em pontos  que pareciam  falsamente inconciliáveis: o uso da tecnologia versus a leitura tradicional. Minha tese é que a leitura é uma tecnologia. Na discussão acabou parecendo que Manguel era um conservador e tradicionalista que só aceitava a leitura dos livros e Kate uma pessoa que  só queria vender seu produto audiovisual.  O Paulo Caruso registrou isto tudo em charges que eram projetadas nos telões na hora da discussão e foram reproduzidas pela imprensa. A "Zero Hora"chegou a dizer que houve um bate-boca.
O que eu disse, superando essa dicotomia, é que há um novo universo da leitura aportado pela internet e que o Brasil que não construiu bibliotecas nem tem livrarias suficientes tinha  a chance de  dar pulo histórico caso se desse conta que os Ipads, os telefones celulares, os computadores e as lanhouses podem fazer o que não fizemos em 500 anos. A tecnologia não e má nem boa, tudo depende do uso que se faz dela. E as novas gerações,  dos anos 80 para cá, que são chamadas de X, Y e Z têm mesmo um novo modo de “ler”. Ao invés de sermos contra, temos que aliciá-los, reinventar com eles o livro e os modos de leitura.
É bom lembrar dessa parábola verdadeira: quando o Marechal Rondon foi designado para implantar o telégrafo com fio por todo o país, ele saiu por aí campeando,  encontrando índios, atravessando rios e montanhas e plantando postes e fios por todo o país. Era uma façanha histórica cobrir todo o  país com o telégrafo com fio.
Pois bem. Quando ele botou o último poste na fronteira  do Brasil com a Bolívia recebeu a noticia de que tinham acabado de descobrir o telégrafo sem fio.
A tecnologia, portanto, pode nos socorrer e resgatar os 500 anos de atraso na área do livro, da leitura e das bibliotecas.  Se o Brasil levou 500 anos para ter cerca de seis mil bibliotecas públicas, hoje temos 109.000 lanhouses em toda parte. Se numa favela como a da Rocinha no Rio, existe só uma precária biblioteca, lá existem por outro lado, 200 lanhouses. Igualmente uma pessoa na margem esquerda do Tapajós ou no Mato Grosso pode ler pelo Google obras clássicas em várias línguas, mesmo que sua cidade não tenha biblioteca nem livraria. A  livraria e a biblioteca que ficavam  longe de nossa casa, hoje estão em nossa mão. Basta acessar.
O desafio que o Ministério da Cultura( e eu diria, o governo) tem hoje é este: lutar para fornecer conteúdo aos  13 mil telecentros que o Ministério da Comunicação implantou pelo pais.
Portanto, a estratégia é fazer alianças e despertar a criatividade. Até as firmas de informática  e o Departamento de Estado dos Esteados Unidos já descobriram que é melhor cooptar os hackers que simplesmente combatê-los.
(*) Estado de Minas/Correio Braziliense, 4.09.2011